sábado, 29 de janeiro de 2011

Por um “Freud implica”... acessando a liberdade na era da globalização


Este texto pretende fazer algumas considerações a respeito da tese de doutorado de Jorge Forbes, intitulada “Inconsciente e responsabilidade” (http://migre.me/3LxrL), em especial naquilo que se refere sobre a responsabilidade frente ao inconsciente nossa pretensão de liberdade.

Essa tese de Forbes nos surpreende, já em um primeiro contato, sobre seu número de páginas. Digo isso pensando naqueles que estão habituados às dissertações e teses acadêmicas que, tradicionalmente, se tornam “verdadeiros” tratados. O que quero dizer com isso? Textos que somam facilmente 300 páginas ou mais. Ao percorrermos esse texto de Forbes, vamos constatando que não é necessariamente preciso intermináveis páginas para se tocar com profundidade certos temas; com destaque esse que já se faz polêmico por pretender discutir assuntos que estamos acostumados a categorizar como dissociados: inconsciente e responsabilidade. Ou seja, como assim poderíamos aplicar responsabilidade naquilo que é inconsciente? O Jurídico não afirma inimputabilidade naquilo que foge à esfera consciente? Pois é, mas Freud (1925/1996) já nos dizia, em suas formulações metapsicológicas, que essas construções sociais dos juristas são bastante artificiais frente aquilo que a psicanálise pode saber sobre nosso ego.

Um dos pontos mais interessantes na tese de Forbes, pelo menos nesse pequeno ponto que resolvemos abordar, é que essa noção de irresponsabilidade frente ao inconsciente – assumida de forma artificial pela sociedade, como Freud nos aponta acima – acabou adentrando o setting psicanalítico. Uma atitude auto-justificada que se estrutura em muitas frases de pacientes como, por exemplo: “se eu fiz isto, foi meu inconsciente” (Forbes, 2010, p. 32). O sujeito se furta da responsabilidade pelos seus desejos através de um discurso supostamente psicanalítico. Ora, se Freud (Op. Cit.) já havia frisado que não existe essa suposta separação de continentes ego e id, ou seja, o nosso ego (Eu) é apenas uma parte modificada e influenciada dIsso – que parte da psicanálise optou por nomear id. Os desejos inconscientes podem ser categorizados moralmente como bons ou maus, tal como os pensamentos conscientes que habitualmente somos inclinados a fazer. Contudo, renegar a responsabilidade frente ao inconsciente é, ao menos, uma escolha nada prática; afinal, de que adiantaria se furtar de assumir e/ou mudar certos desejos em nossa vida cotidiana dizendo não ser nosso certo desejo se ele nos influencia diretamente em nosso cotidiano? “Se alguém ficar insatisfeito com isso e gostar de ser ‘melhor’ do que foi criado, deixem-no ver se pode atingir na vida algo mais que hipocrisia ou inibição” (Freud, Op. Cit.)

E esse ponto que escolhemos para trazer aqui e incitar o leitor a ir a Forbes, se faz interessante principalmente na articulação que esse autor faz com a nova modalidade de relações sociais e de subjetivações que se constrói nesse era chamada “Globalização”, onde o mundo se altera de uma estrutura vertical, pai-orientada para uma horizontal, múltipla. Por quê? Principalmente porque agora não temos mais certas categorias ou pilares sociais para orientar-obrigar certas escolhas. Hoje não serei mais médico ou empresário porque há uma tradição familiar que me impele a isso. Ou ainda, não continuarei casado contigo porque jurei no leito de morte de seu pai que cuidaria de você até o fim de nossos tempos. Na contemporaneidade nossas relações se fazem articuladas e mantidas por desejos mais diretos, que aos olhos mais conservadores seriam “demasiadamente” fugazes. São novos tempos, nova realidade, sem desculpas por escolhas de um Outro. E isso exige uma nova modalidade de responsabilidade. Talvez seja isso que faz Forbes nos convocar a abandonar aquele “Freud explica” por um “Freud implica”, ou seja, não vale mais responsabilizar um passado através de nossas descobertas arqueológicas na mente se não nos implicarmos frente à responsabilidade de nossos desejos e escolhas. “Indabem” que temos mais oportunidades de escolhas hoje; não sejamos reacionários e exigir um mundo do outrora que não existe mais. Se ele realmente tivesse sido perfeito, teríamos abandonado?

REFERÊNCIAS:

FORBES, J. Inconsciente e responsabilidade. Tese de doutorado – UFRJ Instituto de Psicologia, Programa de Pós-Graduação em Teoria Psicanalítica, Outubro de 2010. Acesso em http://migre.me/3LxrL

FREUD, S.. Algumas notas adicionais sobre a interpretação de sonhos como um todo. Parte B: - Responsabilidade moral pelo conteúdo dos sonhos (1925). Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud, Trad. sob a direção de Jayme Salomão. Rio de Janeiro: Imago, 1976, v. XIX, p. 155-173 


 

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